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As ferramentas de Inteligência Artificial Generativa, ou GenAI (ChatGPT, por exemplo) possuem uma ampla gama de aplicações — e vêm desafiando as visões tradicionais sobre conceitos como criatividade, autoria e propriedade. Esses modelos são treinados por meio de grandes volumes de dados — e possuem a capacidade de gerar conteúdos inéditos como textos, músicas, imagens e até mesmo vídeos. O fato, porém, é que, em inúmeros casos, as legislações vigentes não contemplam tais questões.

Esse cenário, naturalmente, apresenta desafios únicos em termos de direitos autorais — que, tradicionalmente, protegem a expressão criativa humana. Os dados que treinam essas aplicações são, frequentemente, extraídos da internet, onde qualquer material que esteja em domínio público pode ser utilizado gratuitamente; há algum tempo, porém, surgiram diversas ações judiciais que contestam a legalidade desse treinamento — especialmente em relação a conteúdos protegidos pelos direitos dos autores.

The New York Times vs. OpenAI e Microsoft

Muito bem: o avanço da Inteligência Artificial Generativa traz à tona diversas questões extremamente relevantes quanto ao reconhecimento — e os direitos — de autores humanos.  Um dos casos mais emblemáticos nesse sentido é a ação judicial que o lendário periódico norte-americano The New York Times abriu, em dezembro de 2023, contra a OpenAI, desenvolvedora do ChatGPT, sob a alegação de uso ilegal de seu conteúdo para treinar bots de IA — ameaçando, assim, seu trabalho jornalístico.

O processo envolve argumentos da Constituição dos Estados Unidos e da Lei de Direitos Autorais, a fim de defender o jornalismo original do The New York Times — que também acusa a Bing, IA da Microsoft (hoje denominada Copilot), de utilizar trechos exatos de seu conteúdo. O jornal, assim, pleiteia uma reparação financeira bilionária — e exige que tanto a OpenAI quanto a Microsoft destruam seus modelos de chatbot e os conjuntos de treinamento que integram seus conteúdos.

Outras ações judiciais associadas à GenAI

Deve-se observar, ainda, que existem diversas ações judiciais semelhantes em curso. Em fevereiro de 2023, por exemplo, a Getty Images, fornecedor de imagens que possui um arquivo com mais de 470 milhões de imagens e ilustrações — além de aproximadamente 50.000 horas de filmagens —, apresentou uma queixa contra a Stability AI, empresa de tecnologia que usou parte desse material, sem consentimento, para treinar a Stable Diffusion — sua ferramenta de geração de imagens.

Em setembro do mesmo ano, a Author’s Guild, organização profissional norte-americana para escritores, entrou com uma ação na qual alega que a OpenAI vem utilizando material protegido por direitos autorais para treinar seus chatbots sem consentimento ou compensação. E, em outubro, a Anthropic PBC, startup de IA fundada por ex-funcionários da OpenAI, foi acionada pelas empresas Universal Music, Music-Z Songs e ABKO Music Inc., entre outras, por usar letras para composições, sem permissão, a fim de treinar Claude — seu modelo de GenAI.

Direitos autorais e GenAI: pontos divergentes

De acordo com especialistas, tais ações representam um verdadeiro divisor de águas.  De um lado, empresas de tecnologia alertam que os processos judiciais podem frear a crescente indústria de IA; de outro, os demandantes afirmam que essas organizações devem pagar por usarem seu trabalho sem permissão ou compensação — e essa é apenas a face mais visível desse iceberg. Até 2026, aponta uma pesquisa da Gartner, os gastos defensivos para minimizar a perda de propriedade intelectual e violações de direitos autorais desacelerarão a adoção do aprendizado da GenAI — e, por consequência, reduzirão os retornos.

Além do entrave à inovação em termos de IA, as empresas demandadas argumentam que o processo de treinamento dos chatbots são apenas uma etapa intermediária no desenvolvimento da tecnologia, que abrange apenas conteúdos insignificantes de obras protegidas — e que pode ser comparada à prática de engenharia reversa. Também afirmam que a análise da propriedade desses materiais é impraticável — e que os valores seriam muito pequenos beneficiar, de fato, os autores. Outro argumento é que o treinamento dos chatbots seria comparável à utilização do aprendizado por meio da leitura de um livro — e, dessa forma, não pode ser considerado violação de direitos autorais.

Novas leis e regulamentações para AI

Para todos os efeitos, a complexidade dessas questões ainda deve suscitar debates acalorados, mas tem evoluído tanto em termos de conclusões judiciais quanto na criação de legislações específicas — que estruturarão a relação entre direitos autorais e Inteligência Artificial generativa em diversas esferas. É o caso das aplicações em marketing e publicidade (entre outras áreas), que envolvem criação de conteúdo, SEO e análise de sentimentos, entre outras, e podem dar margem a diferentes demandas legais — como violações de direitos autorais e de privacidade.

Vale destacar que a União Europeia se tornou uma das primeiras regiões a progredir significativamente quanto à aprovação de uma lei para regulamentar a implementação e o desenvolvimento de GenAI. Proposta em abril de 2023, a EU AI Act, ou “Lei de IA da UE”, entre outras atribuições, definirá normas de utilização para o uso da Inteligência Artificial, além de monitorar grandes sistemas como o ChatGPT e estabelecer os protocolos de transparência que tais sistemas deverão seguir antes de entrarem no mercado. O projeto de lei, contudo, tem recebido críticas do setor de tecnologia por excesso de regulamentação.

Nos EUA, a regulamentação sobre a GenAI vem avançando com o objetivo é garantir a segurança da IA e proteger a privacidade, bem como promover equidade e direitos civis — além de incentivar a inovação e desenvolvimento da tecnologia. Há, ainda, uma crescente conscientização entre os norte-americanos acerca da importância de enquadrar, em termos regulatórios, os tipos e usos da IA segundo seus riscos — abordagem que se assemelha ao EU AI Act. Já no Brasil destaca-se o PL 4025/23, projeto de lei que apresenta medidas de proteção a direitos autorais e individuais, impondo restrições à utilização de obras, textos e imagens por ferramentas de IA.

No futuro

Diante desse cenário, é possível compreender a complexidade da interação entre tecnologia e criatividade — e, ainda, contemplar um futuro no qual a Inteligência Artificial generativa ampliará seu papel como uma ferramenta de colaboração imprescindível para aprimorar processos criativos. Porém, é importante considerar que, nessa jornada, a tecnologia e as leis devem caminhar lado a lado — e seus desafios, embora pareçam assustadores, apresentam grandes oportunidades.  Afinal, o equilíbrio entre a promoção da inovação com a devida proteção aos direitos autorais e a preservação da criatividade humana será condição basilar para o futuro e a evolução da GenAI.